Temo a guerra, a pobreza e os sonhos adiados,
temo a fome, a tristeza e os amores desencantados.
Temo os invernos sem chuva e os verões sem calor,
temo a esperança perdida e uma vida sem amor.
Temo as palavras que ferem, o cinismo e a falsidade
e a deslavada mentira disfarçada de verdade.
Temo os beijos sem doçura e os abraços sem chama
e temo o dobrar dos sinos por aqueles que se ama.
Temo a dor e temo a morte, a loucura e o esquecimento,
temo depender da sorte e temo o arrependimento.
Temo as farpas do ciúme e os espinhos da rosa,
temo a poesia morta e o vazio da prosa.
Temo a lágrima escondida, aquela que ninguém vê
e o soluço abafado que não encontra um porquê.
Temo as questões sem resposta e os desejos impossíveis,
os segredos mal guardados e os corações insensíveis.
Temo a ausência do vento que não ondula as searas,
os pesadelos dos dias inúteis e as insónias das noites claras.
Temo esquecer as dores que deram valor ao riso
e as portas que se abriram sempre que tal foi preciso.
Temo os outonos sem cheiro de terra molhada
e temo o amor cansado e a morte anunciada.
Temo a renúncia e a resignação de apenas existir,
o egoísmo desenfreado e o amor doentio de quem não deixa partir.
Temo os sorrisos falsos e a cegueira de quem não quer ver,
as madrugadas que não chegam a ser dia e os crepúsculos que não vão anoitecer.
Temo os prantos que desnudam a alma e as saudades que não cabem no peito,
temo a vida mal vivida no pretérito imperfeito.
Temo as areias movediças da vontade e o rochedo aguçado do destino,
temo a ingratidão, a arrogância e o castigo divino.
Temo as mortes necessárias e a liberdade proibida
e a sede de poder pela ambição desmedida.
Temo perder a essência de quem realmente sou
e os caminhos tortuosos na senda por onde vou.
Temo o papão que se esconde debaixo da minha cama
e além das tramas da vida, temo a forma, tão subtil, como esta vida nos trama.
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Josefina Maria Alves da Luz Graça - Lagos
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